O Verbo Ouvir

Concordo com o senhor Arthur da Távola em “gênero, número, mas não em grau”, no que se refere ao artigo atribuído a ele (O Difícil Facilitário do Verbo Ouvir).
Concordo quando ele diz “Como é raro e difícil comunicar”, mas não que existam 12 pontos a serem observados. Tal afirmação, a meu ver, não passa de pura retórica cujas muitas classes não denotam o “feminino” tampouco o “masculino” da questão. Não enxergo tanta singularidade, assim como não devemos exagerar ao se tentar pluralizar demasiadamente o assunto.
Claro que há aqueles que apenas ouvem a si mesmos, como também aqueles que se entregam ao que ouviram. Contudo, um meio termo saudável, quanto ao ato de ouvir, é praticada por uma pequena parcela das mentes, realmente, vívidas quanto privilegiadas. Acredito neste pensamento porque toda fala (oral ou escrita), verdadeira ou não, tem como intuito a persuasão nua e crua. Uma vez que pretende induzir, na medida em que tenta “aconselhar” e ao mesmo tempo convencer o outro a aceitar o que está sendo dito ­– independente do meio pelo qual ela, a informação fidedigna ou não, se propaga.
A inteligência não atrapalha a plena audiência. Ao contrário, ela seleciona o que é relevante do argumento do outro, põe à prova a coerência do raciocínio... Porque ao agirmos como inocentes frente à retórica, terminamos como tolos, como se nos encontrássemos a um passo do cidadão Kane.
Documentário a parte. Acredito na singularidade do discernimento. Assim como na pluralidade das opiniões. O ouvir como facultativo aos olhos do senso crítico, e o falar como necessidade de se escapar à manipulação.
Se realmente fosse possível ouvir o outro sem qualquer reserva, o mundo teria menos grades, alarmes e cercas elétricas.
Ouvir, dar ouvidos às palavras, é mais complexo do que imagina a vã filosofia.

Luciano Borges
Escritor e professor barretense
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