Eu Tenho um Sonho


O artigo de hoje, caro leitor, tenta estabelecer uma relação entre o livro/filme “O Diário de Anne Frank” e a mais recente obra do autor Khaled Hosseini, intitulada “A cidade do sol” – o mesmo autor de “O caçador de pipas”.
Recentemente assisti junto dos meus alunos ao filme “Escritores da Liberdade”, com o intuito de incentivá-los a lerem literatura. Todos eles adoraram, uma vez que o enredo estimulava os alunos do filme a escreverem um diário que retrate o cotidiano trágico de suas vidas. Vale dizer que a classe no drama em questão era a mais heterogênea possível, porque havia nela várias etnias reunidas.
Em um determinado momento do filme, vários alunos são mostrados lendo trechos diferentes de O Diário de Anne Frank... E um, em especial, me chamou atenção. Anne Frank escreveu: “Sábado, 20 de junho de 1942 – A partir de 1940 foram-se acabando os bons tempos. Primeiro veio a guerra, depois a capitulação, em seguida a entrada dos alemães. E então começou a miséria. A uma lei ditatorial seguia-se outra; e, em especial para os judeus, as coisas começaram a ficar feias. Obrigaram-nos a usar a estrela e a entregar as bicicletas, não nos deixavam andar nos carros elétricos e muito menos de automóvel. Os judeus só podiam fazer compras das 3 às 5 horas – e só em lojas judaicas. Não podiam sair à rua depois das oito da noite e nem sequer ficar no quintal ou na varanda. Não podiam ir ao teatro nem ao cinema, nem frequentar qualquer lugar de divertimentos. Também não podiam nadar, nem jogar tênis ou hóquei, nem praticar qualquer outro desporto. Os judeus não podiam visitar os cristãos. As crianças judaicas eram obrigadas a frequentar escolas judaicas. Cada vez saíam mais decretos... Toda a nossa vida estava sujeita a enorme pressão"(p.06).
Terminado o filme, não me foi possível deixar de pensar num trecho do livro “A cidade do sol” e relacioná-lo com o que havia acabado de assistir. No livro de Khaled Hosseini, que retrata um dado momento do Afeganistão, na página 245, diz: “É proibido cantar, dançar, jogar cartas, xadrez, fazer apostas e soltar pipas. É proibido escrever livros, ver filmes e pintar quadros. Quem possuir periquitos será espancado, e os pássaros, mortos... Não é adequado a uma mulher circular pelas ruas sem estar indo a um local determinado. Quem sair de casa deverá se fazer acompanhar de um parente do sexo masculino. A mulher que for apanhada sozinha na rua será espancada e mandada de volta para casa...”
A liberdade, caro leitor, é a capacidade de se decidir, ou agir segundo a própria determinação. Entende-se também como a faculdade de praticar tudo o quanto não é proibido por lei. Do mesmo modo, é a ausência de opressão considerada anormal, ilegítima e imoral. Ora, se são os homens que promulgam as leis, coitado daquele que por força do seu pensamento consegue sobrepor um texto a outro; que por seu intelecto, a partir da leitura de inúmeros outros livros, consegue pensar por si mesmo e discernir uma boa ação de uma ruim.
Será que uma coisa horrível como o holocausto poderia voltar a acontecer? Acredito que sim... quando ninguém mais puder sair de casa desacompanhado, visitar outra fé religiosa; estar proibido de cantar, dançar e escrever livros; quando por falta de livros a humanidade não puder vir a saber das iniquidades de seus antepassados – até como forma de não repeti-las.
É, eu tenho um sonho...

Luciano Borges
Escritor e Professor
lb.letras@gmail.com

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