Sob o Olhar do Medo

O medo é um sentimento de grande inquietação. Está muitas vezes ligado a um perigo real ou imaginário. Tem a ver com alguma ameaça... Diante do medo podemos sentir pavor, temor, terror.
Diante do medo, astros do cinema como Jackie Chan caem em descrédito ao afirmar: “Estou começando gradualmente a sentir que os chineses precisam ser controlados”. Desnecessário dizer que esta declaração gerou grande celeuma na China – neste que é o país mais populoso do mundo (cerca de 1 bilhão e 350 mil pessoas). Esteja Jackie Chan certo ou não, sejam quais forem os motivos que o levaram a afirmar o que disse, ele teme algo... real ou não.
Lendo o livro “A Cidade do Sol” do escritor Khaled Hosseini — mesmo escritor de “O Caçador de Pipas” – fiquei sensibilizado por uma passagem na obra, na qual uma das personagens, sob uma burca (veste negra usada em público por algumas mulheres muçulmanas, que envolve o corpo, inclusive a cabeça), agradece a Deus por ali estar. Longe dos olhos inquiridores de outras pessoas. Sob a burca, uma mulher está protegida, anônima numa multidão entre iguais. Não estou aqui, caro leitor, com esse comentário tentando fazer qualquer juízo de valor. Afinal, a cultura de um povo é sagrada, assim como a fé. O que trago para a discussão não é o uso da burca em si, mas o medo da citada mulher de enfrentar o mundo fora dela.
No livro “Ensaio sobre a Cegueira”, do escritor e poeta José Saramago, há uma menção forte sobre o medo do homem diante do fato de não poder mais enxergar um palmo diante de si. É um relato contundente, apesar de ficcional, de como o medo pode arrancar do homem a razão, destituindo-o de sua civilidade.
Há quem acorde inúmeras vezes durante a noite. Não porque não tenha sono. Não que não haja cansaço físico... É a preocupação a amofinar a alma. Muitas vezes este sofrimento moral se dá por antecipação, diante de situações que pouco se pode realizar. Pelo simples fato de que... depende de outras pessoas. E assim o corpo acompanha o espírito, pelo caminho do desgaste através do medo.
Hoje se tem medo até de colocar o lixo na rua, porque antes que o serviço limpeza pública passe para recolhê-lo, outras almas os espalham pela calçada. Não por farra, mas atrás de algo que lhes possa dar algum lucro.
Assim fico eu aqui, sob o olhar do medo, repetindo para mim uma frase do livro I Ching que diz: “Na ponta dos pés não se fica ereto; a quietude domina a agitação”.

Luciano Borges / Escritor e Professor

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